"Como dois e dois são quatro/Sei que a vida vale a pena/Embora o pão seja caro/E a liberdade pequena" (Ferreira Gullar)
Landro Oviedo
"Somente buscando palavras é que se encontram pensamentos" (Joseph Joubert)
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UMA CANECA LINDA E POLÊMICA
  No sábado, 17.3.2017, o meu amigo, missioneiro e quadrinista Sávio Moura, autor das famosas tiras da série “É dura a vida no campo”, veio me visitar em meu escritório para me trazer a sua mais nova  ideia concretizada: uma caneca com tiras dos personagens. Já é um sucesso, como ocorre com várias das suas produções. Aliás, foi um orgulho trazer seu traço para o Correio do Povo, de Porto Alegre, jornal do qual sou editorialista há mais de uma década.
  Pois bem, conversa vai, conversa vem, e o Sávio me questionou sobre a frase estampada na caneca, que perpassa todos os quadrinhos. Ei-la:
  “O que eu gosto aqui no campo é da tranquilidade.”
  Qual foi o questionamento do Sávio, algo que surgiu já por polêmica em São Luiz Gonzaga.
  Seria “da tranquilidade” ou “a tranquilidade”?
  Pedi um tempo pra pensar. 
  (Parêntese: certa vez, ouvi de viva voz do meu saudoso amigo professor Joaquim José Felizardo, de verve genial, que quando o Alceu Collares, ex-prefeito de Porto Alegre, o convidou para ser secretário da Cultura da Capital, ele pediu três dias para pensar sobre o assunto. A partir daí, passou a ser considerado o maior intelectual do PDT no RS. Fecha parêntese e voltemos ao nosso imbróglio gramatical.)
  Pois bem, minha interpretação é esta a seguir.
  Primeiramente, como devemos fazer, vamos atrás do sujeito. Inverti a frase:
  “A tranquilidade é o que eu gosto aqui no campo.”
  Bem, já sabemos, que é “a tranquilidade”, sem a preposição “de”.
  Ocorre, no entanto, que não posso apenas manter a estrutura sintática anterior tirando o “de”:
  “O que eu gosto aqui no campo é a tranquilidade.”
  O fato de termos dois núcleos verbais aponta para um período composto:
  “A tranquilidade é o que eu gosto aqui no campo.”
  Mas antes de fazer essa análise das orações internas, temos que mexer na coesão textual, uma vez que o verbo gostar é transitivo indireto e exige a preposição “de”. Vamos lá alojar esse “de” no lugar cabível.
  “A tranquilidade é do que eu gosto aqui no campo.” Pronto! Vamos à análise sintática, pois temos agora duas orações.
  “A tranquilidade é o”: Oração principal. Reparem que esse “o” é pronome demonstrativo e equivale a “aquilo”. Posso trocar também por um substantivo (“fim”, “objetivo”, “meta”).
  Tendo oração principal, terei uma subordinada:
  “(...) de que  eu gosto aqui no campo”, que é equivalente, neste caso, a “do qual eu gosto aqui no campo”. Vemos que temos o “que” pronome relativo, que costuma introduzir as orações subordinadas adjetivas. Bingo! Essa é, e adjetiva restritiva, porque se liga ao seu referente sem vírgulas, particularizando e não ampliando seu significado. E por que ela é adjetiva? O próprio nome ajuda. Toda ela poderia ser trocada por um adjetivo:
  “A tranquilidade é o ALMEJADO.”
  Desta forma, para se manter a estrutura da frase original, ela teria de ser escrita assim:
  “Do que eu gosto aqui no campo é a tranquilidade.” O Sávio já me adiantou que as próximas virão  com essa escrita.
  Do que eu gosto no Português é a dúvida. Ajuda-nos a pensar. E a discordar. Como escrevi tudo de supetão, correções pontuais são bem-vindas. E interpretações divergentes e embasadas também. Um brinde de caneca gaudéria a todos. 
Landro Oviedo
Enviado por Landro Oviedo em 19/03/2017
Alterado em 21/03/2017
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