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Leia nesta edição - Número 13 - Janeiro-fevereiro/2013:
* O consumidor, esse trouxa preferido das empresas
* Parques e monumentos só serão preservados caso sejam cercados e fechados à noite
* Caderno de notas ("Dá com uma mão...", "...Tira com a outra", "Idosos", "Prêmio preto")
* Arrecadação segura / Números mostram: Lei Seca é só arrecadatória
* Cem anos de "Lendas do Sul" / O Anguera
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Contato: landrooviedo@uol.com.br, (51) 4100-0040 (TIM)
Velha iguaria campeira
Com água na boca eu fico
Sempre na mesa do povo
Seja do pobre ou do rico
Primazia do Itaqui
Vos falo do pão de bico.
* A foto do pão de bico é da itaquiense Lara Isadora Rodrigues
Já fazia mais de uma década que eu não via a Mara Flores. Farmacêutica, bioquímica, esforçada, linda, cativante e apaixonada pela vida. Eu não sei em que escaninho das mudanças de residência eu coloquei o telefone dela e nunca mais encontrei. Mas como a vida continua, fui deixando esse dever de casa para fazer a qualquer momento, como se eu tivera todo o tempo do mundo. Nesta quinta-feira, por algum desígnio dos deuses da memória, o fone da Mara me sobreveio inteiro, intacto, nominal e numerativo.
Imediatamente liguei, com o número redivivo, como se eu houvera ligado na véspera. Vi que não era a voz da Mara, de uma outra pessoa: “Quem é?”, “Eu sou o Landro, amigo da Mara, ela está?”, “Tu não sabias? Ela morreu há um ano, em janeiro”, “Quem está falando?”, “Aqui é a Márcia, irmã dela”.
A partir daí, travou-se um diálogo de retomada, de saudades, de comiseração por uma vida cortada por uma doença impositiva. Restaram-me as lembranças dos bares, das conversas inteligentes por parte dela, da tentativa de me fazer ler José Saramago sem pontuação, do cinema, dos bares, dos mates, das pizzas, das alegrias, das dores divididas e da música de Piazzolla, que ela amava como trilha sonora da sua aguçada sensibilidade.
Mara, perdoa-me por esses longos dias longe de ti. Vou guardar teu sorriso e tua voz sonora e musical como lembrança de momentos em que iluminaste tudo ao teu derredor, como que dizendo que estavas viva inteira, soberana e companheira. Obrigado por tua amizade, pelo teu carinho e por teres cruzado minha vida para me ensinar que amar é o melhor sentido para ela.
Mara, obrigado por teres vindo
A memória e o tempo
mantêm uma eterna rixa
pra provar o pão feito em casa
eu tinha a primeira ficha
minha avó botava feijões
nos olhos da lagartixa.
No Dia do Compositor, nada melhor que lembrar os versos do poeta Fernando Pessoa sobre a arte da criação, da dialética entre criador e criatura no exercício de transfigurar a realidade ou de, por vezes, tomá-la como uma dimensão aparente.
Boa leitura...
Autopsicografia
(Fernando Pessoa)
O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.
Fernando Pessoa, a própria personagem dos seus heterônimos