Já fazia mais de uma década que eu não via a Mara Flores. Farmacêutica, bioquímica, esforçada, linda, cativante e apaixonada pela vida. Eu não sei em que escaninho das mudanças de residência eu coloquei o telefone dela e nunca mais encontrei. Mas como a vida continua, fui deixando esse dever de casa para fazer a qualquer momento, como se eu tivera todo o tempo do mundo. Nesta quinta-feira, por algum desígnio dos deuses da memória, o fone da Mara me sobreveio inteiro, intacto, nominal e numerativo.
Imediatamente liguei, com o número redivivo, como se eu houvera ligado na véspera. Vi que não era a voz da Mara, de uma outra pessoa: “Quem é?”, “Eu sou o Landro, amigo da Mara, ela está?”, “Tu não sabias? Ela morreu há um ano, em janeiro”, “Quem está falando?”, “Aqui é a Márcia, irmã dela”.
A partir daí, travou-se um diálogo de retomada, de saudades, de comiseração por uma vida cortada por uma doença impositiva. Restaram-me as lembranças dos bares, das conversas inteligentes por parte dela, da tentativa de me fazer ler José Saramago sem pontuação, do cinema, dos bares, dos mates, das pizzas, das alegrias, das dores divididas e da música de Piazzolla, que ela amava como trilha sonora da sua aguçada sensibilidade.
Mara, perdoa-me por esses longos dias longe de ti. Vou guardar teu sorriso e tua voz sonora e musical como lembrança de momentos em que iluminaste tudo ao teu derredor, como que dizendo que estavas viva inteira, soberana e companheira. Obrigado por tua amizade, pelo teu carinho e por teres cruzado minha vida para me ensinar que amar é o melhor sentido para ela.
Mara, obrigado por teres vindo