Tenho lido muitos sonetos ao longo da minha vida e, de alguns, algumas frases esparsas nos grudam como carimbos poéticos. Quem não se lembra de vez em quando de “Amor é fogo que arde sem se ver”, de “De repente, do riso fez-se o pranto” ou de “Ó, tu, que vens de longe, ó, tu, que vens cansada”? São verdadeiras ourivesarias dos versos, imagens sonoras antológicas que nos remetem a uma dimensão lírica sempre antiga e, ao mesmo tempo, sempre ressignificada.
Pois bem, o soneto que vou mostrar a vocês é da lavra do poeta passo-fundense Ubiratan Porto, recentemente falecido, que também já morou e atuou em Porto Alegre como advogado e ativista cultural e em Capão da Canoa. Está no livro “O voo do visor”, de 1981. Para mim, é um dos mais lindos sonetos já escritos na língua portuguesa. Qualquer coincidência com os grandes vates da última flor do Lácio não é mera coincidência. Mas também não é mera semelhança.
SONETO DE DESAMOR
Não falar de amor... nem por amor buscar
Que amar não é o fim, mas o meio e traga
A ilusão e a inocência, qual a vaga
De um coração por tenebroso mar.
Não lembrar de amor... embora em dor a paga
Seja o sonho irreal da solidão e no olhar
Outros olhares seu alento façam orar:
Que por um seio amigo nunca um ser naufraga.
Não lamentar... apenas salmo de tristeza
Reter na alma o acalanto da ternura e mudo
Velho anseio no amanhã por uma nova amada;
Simplesmente passar... e por amor, sem surpresa
Ver que ele já pousou na vida (quem sabe o tudo)
Ou nunca existiu... para morrer (talvez de nada!)