MUNDO CHATO
Uma das frases mais célebres atribuídas a Sócrates, durante seu julgamento em Atenas, é aquela em que afirma que uma vida sem reflexão não merece ser vivida. A vida de um ser que deveria ser pensante, ressalte-se, pois os animais e as plantas já vêm e vão do mundo com uma existência plena.
Eu lembrei esse mote ao constatar que hoje o mundo está muito chato, com as pessoas esposando teses previsíveis e, algumas delas, já carcomidas pela história, recauchutadas e apresentadas como novas, a exemplo do neoliberalismo, que nada mais é do que uma falsa união entre quem paga impostos e quem gasta.
Nos meus tempos de estudante, o bar era a extensão da academia, da vida rebelde e da investigação filosófica. Agora, os espaços abertos estão tomados por gente trazendo chavões e ideias preconcebidas. Uma das mais hilárias é a da narrativa do golpe contra Dilma. O PT se afundou por se unir com criminosos e seus defensores transformaram isso numa vitimização orquestrada. Sem falar no “Lula Livre”, que é uma consigna de alienação.
Os partidários de Jair Bolsonaro não têm uma diferenciação substantiva. O patriotismo é um chavão indecente e nada mais do que é um chamado para que os pobres adotem seus algozes. A melhor ideologia é combater todas as formas de ideologia para restar incólume uma só forma de mando.
Daqui de onde estou sentado, é muito difícil contemplar a história, que se move a passos de pés de barro. Mas, felizmente, ela não é o que eu penso ou o que eu acho ou o que eu espero. Ela é dinâmica e torrencial quando os acontecimentos a deflagram. Não fora assim, teríamos Castro Alves, mas não teríamos a abolição da escravatura.
Lupicínio Rodrigues um dia escreveu: “Esses moços, pobres moços / Ah, se soubessem o que sei”. Não se trata de ter certa arrogância natural da experiência, mas de saber que temos pressa de avançar sem precisar reinventar a roda. Oswald de Andrade já advertiu que é preciso ver com olhos livres. Infelizmente, num tempo em que se fecham livrarias e se demandam vagas nos presídios, ler, ouvir e falar se tornaram tarefas disfuncionalizadas. Grandes ideias se tornaram produtos para seminários vultosos e ao varejo restaram chavões pelos quais os contendores se debatem furiosos na planície. A vida está se tornando tão verdadeira e original quanto um holograma de si mesma.