O TOURO DESGOVERNADO
Já dizia Platão que não há mal nenhum em não gostar de política, mas os que não gostam têm o ônus de serem governados pelos que gostam. E vejam que aqui, semanticamente, “política” quer dizer a arte de conduzir os negócios públicos, como era uma prática dos gregos, que se reuniam em assembleias, as ágoras, para decidir os rumos de sua cidade-estado Atenas. Essa palavra ganhou, ao longo dos tempos, foro de palavrão, mas isso é injusto com sua história. Deveria haver outro termo para qualificar nossas atuais instâncias de poder, que são verdadeiras ações entre amigos. Às vezes até entre inimigos.
Em meio a uma contumaz falta de estudo e de entendimento, a população sói compreender pelas vias dos que não a querem minimamente sábia. Assim, existem falsas oposições, como democracia e regime militar. Ora, quem pesquisa vai entender que os regimes brasileiros, seja na ditadura militar, seja no período civil, sempre foram capitaneados pelas elites brasileiras, pelos banqueiros e afins. Dessa forma, opor democracia com período militar é uma comparação inócua. A pirâmide social é a mesma. A luta de classes não é uma metáfora, é uma realidade da história. Uns trabalham, outros sugam. Espártaco, o gladiador romano, que o diga.
A verdade é que a população é como um touro desgovernado. Não sabe a força que tem. O toureiro sente-se seguro por conta de sua irracionalidade. A do touro, para evitar ambiguidade. O pior de tudo é que uns muitos se tornam reféns de uns poucos. E acreditam em suas versões. As palavras e as ideologias dominantes têm o poder de reduzir a pó a esperança dos pobres, tanto de renda quanto de espírito.
Jornal Nova Folha, Guaíba-RS, 20.5.2022.