SALVEMOS OS PLURAIS!
No curso de Letras, há uma luta latente que se assemelha à de chimangos e maragatos, gremistas e colorados. Trata-se da divisão entre os linguistas e os gramáticos. Para os linguistas, não deve haver modelos de linguagem e ela deve ser retratada tal e qual seu uso no cotidiano. Já para os gramáticos, é preciso haver paradigmas e normas gramaticais, porque isso preserva a unidade da língua e garante maior clareza na comunicação. Já adianto que, como professor de português, filio-me à segunda corrente. Afinal, o código tem suas sutilezas e é preciso estar preparado para enfrentá-las, como no caso da interpretação de um contrato de compra e venda. O teor será formal e, nesse caso, as limitações de uma linguagem coloquial serão de pouca valia. Claro que não se está dizendo que a língua não tem variações, mas que, antes de certo e errado, é preciso adaptá-la para as situações de uso. Como nosso vestuário: para uma formatura, roupa apurada; para uma festa de bar, roupa despojada.
Nesse sentido, vejo como relevante a preservação dos plurais, ameaçados de extinção por uma grande maioria dos falantes. Não é “os prato”, mas “os pratos”; não é “as mão”, mas “as mãos”. Pronunciá-los de forma clara mostra uma preocupação em garantir a expressividade dos fonemas, sua eufonia, logrando uma estética do ato de fala, a exemplo do que ocorre com quem tem um vocabulário mais amplo, com maior facilidade de dizer o que pensa. “Somente buscando palavras é que se encontram pensamentos”, já dizia Joseph Joubert. Isso estimula emissor e receptor.
A língua é um patrimônio de todos e não de alguns sobre todos. Portanto, aprendê-la e usá-la corretamente é a melhor maneira de poder resistir a um reducionismo cultural degradante e o melhor caminho para apreender valores, conceitos e verdades, aquelas que enlevam e elevam o pensamento crítico e ajudam as pessoas a lutar por um mundo melhor e mais fraterno.
Jornal Nova Folha, Guaíba-RS, 10.6.2022.