HISTÓRIAS ORBITANTES
1) Carro manhoso. Ao final da década de 90, eu tinha um Fiat Uno Prêmio preto que era um carro de mecânico: passava muito tempo na oficina. Além disso, por ser a álcool, no inverno, as chances de ligá-lo pela forma natural, via chave de ignição, diminuíam sensivelmente. Na época, eu frequentava muito o bar e restaurante Estância de São Pedro, reduto gaudério no bairro Cidade Baixa, em Porto Alegre. Pois bem, esse carro era manhoso e afogava com certa facilidade, ainda mais contando que, muitas vezes, seu condutor saía do estabelecimento chamando Jesus de Genésio. Diante dos afogamentos constantes, não tinha jeito: eu apelava para um PIB qualificado da música gaúcha e, não raro, João de Almeida Neto, João Vicente, Jorge Alberto Mota, Martin Coplas e Yamandu Costa se revezavam na tarefa de empurrar o desgranido.
2) Fazendo um extra. Certa feita, no palco da referida Estância, estava o José Cláudio Machado fazendo um costado aos músicos e cantando uma de suas canções. Entre uma estrofe e outra, ele fez um aceno insistente ao Délvio Oviedo, que se aproximou dele e, à meia voz, perguntou: “Queres que eu vá de violão?”. José Cláudio respondeu: “Não, não, não. Vem de garçom”.
3) Meia-sola. Meu saudoso amigo rosariense Mario Cezar Castro, poeta e compositor, era um impagável. Numa ocasião, tirou uma dama para dançar num daqueles bailes famosos da Capital, no Clube de Portugal. Empertigada e com ar de enfado, ela disse que só dançava uma. O Mario aceitou e foram bailar. Daí a um pouco, ele agradeceu à moça e parou de dançar. Ela estranhou e falou: “Não acabou ainda”. Ele, com a cara mais preparada do mundo (e de Rosário do Sul também), respondeu: “A senhorita só dança uma, eu só danço meia”.
4) Aula prática. Meu colega professor Alberto de los Santos Júnior, em período noturno no ensino médio, introduz o tema da Segunda Guerra e, pelo sinal do fim do seu horário, interrompe o assunto e promete retomar na semana seguinte. Chega então seu retorno àquela turma e ele continua a discorrer de onde parou. Um aluno o interrompe: “Professor, o senhor já deu uma aula teórica sobre isso. Não dá para termos uma aula prática?”. De los Santos responde: “Sabe o que é, meu filho, é que nós temos limitações orçamentárias próprias de escola pública. Não dispomos de recursos para comprar aviões, tanques, canhões, navios e metralhadoras”.
Jornal Nova Folha, Guaíba-RS, 1º.7.2022.