UMA DICOTOMIA MUITO ATUAL

     O estudo é um meio necessário, ainda que não possa ser suficiente, para que as pessoas possam ter uma visão de mundo mais coerente, com argumentos lógicos formados por premissas adequadas. Claro que existe o saber empírico, que não vem dos bancos escolares, mas mesmo ele não prescinde da observação do meio externo, da generalização a partir de uma verificação de ocorrências de um determinado fenômeno. 

     Essa preocupação de estabelecer uma observação coerente e, com isso, opiniões bem embasadas, parecem estar fora do horizonte de milhões de brasileiros atualmente, ainda que possam não ser a maioria, o que quero crer que não. Mal comparando, é como se involuíssemos dos filósofos pré-socráticos para os místicos dos primórdios da fabulação ocidental. Os primeiros se voltaram para a natureza para tentar entender o que lhes parecia nebuloso. Já os segundos davam vazão às suas crendices e credulidades para justificar aquilo que lhes fugia ao entendimento. 

     Atualmente, a impressão que temos é que essa antiga batalha do cotidiano da humanidade está de volta. Há os que procuram dados, informações, checam notícias, valorizam a epistemologia e há outros que se contentam em repassar boatos e chancelar estultícias, como a ameaça do comunismo, Jesus na goiabeira, banheiros “unissex”, escola sem partido e um estímulo ao machismo e à misogenia como algo saudável, entre outras ideações não menos extravagantes.

     Essa dicotomia opõe racionalidade e terceirização mental. Nenhum cidadão minimamente consciente dos reflexo de sua ação ou omissão vai deixar de buscar sua influência e representatividade. Já os terceirizados mentais, como os bolsonaristas, podem até ter, como costumam ter, ação, mas ela será irrefletida, condicionada, manipulada. São tão importantes que ganharam uma canção só pra eles, “Maria vai com as outras”, de Vinícius de Morais e Toquinho.

Jornal Nova Folha, Guaíba-RS, 14.10.2022.

Para ler no PDF do impresso, clique abaixo:

https://rl.art.br/arquivos/7627633.pdf